Estamos no terceiro milênio.
Parece que esta passagem de época representou uma oportunidade para fazermos a revisão da história. Nos últimos anos do milênio passado vivíamos um clima de fim de festa. Eram muitas as celebrações. Todos falavam no advento do novo milênio. Pois bem, o tão esperado século 21 chegou. E agora? O que fazemos com este tempo novo? Acordamos no dia seguinte e percebemos que os desafios e os problemas continuavam lá, no mesmo lugar. Muitos achavam que o mundo iria simplesmente acabar. Os profetas do apocalipse sempre gostam de datas cheias de “zero”. Mas nada aconteceu de tão espetacular. Parece que o céu não dá muita atenção aos nossos cálculos e números.
A vida não se resume em uma equação. O mundo está voltando das férias. Estamos nos primeiros dias de trabalho. E vai demorar muito para termos um novo jubileu, um novo século, um novo milênio. É hora de colocar a mão na massa.
Mas uma coisa é certa: voltamos da festa com a disposição de fazer a revisão de nossas vidas e de nossas instituições. O avanço das tecnologias de informação ajudam a colocar tudo às claras. Alguns, mais pessimistas, podem achar que o que estamos assistindo nos telejornais, ou acompanhando em tempo real pela internet é escandalosamente pior do que existia nos “bons tempos” do milênio passado. Acho que não.
Desde Adão e Eva, Caim e Abel que o mundo enfrenta problemas como a corrupção e o roubo, a injustiça e a violência, a crise de valores e o individualismo. Não somos melhores nem piores. Somos humanos. Devemos evitar este complexo exagerado de culpa. A melhor terapia é aproveitar as oportunidades do nosso tempo para mudar alguma coisa. O fato é que hoje a comunicação ficou muito mais facilitada do que nos tempos da pequena aldeia. Acompanhamos debates sobre os trangênicos ao vivo do plenário do senado ou da câmara.
Assistimos uma guerra louca deitados na cama. Podemos “teclar” com os quatro cantos do país ou do mundo pelos chats da internet. Mas o incrível é que a dilatação de todas estas possibilidades não representou um aumento da intimidade entre marido e mulher, pais e filhos. Ficamos mais irreverentes, mas também mais tímidos. Há filhos que não preocupam seus pais pois não voltam tarde. Ficam apenas no quarto. Um computador e alguns violentos joguinhos em rede são suficientes. Ainda não sabemos qual será o efeito de tudo isso. Estamos arriscando manipular a vida. Fizemos clones e brincamos de deus. Também ficamos presos nas enchentes loucas de São Paulo ou sofremos com um frio inexplicável, ou um calor fora de época. A natureza não perdoa nunca.
Nossa juventude tatuada é incompreensível para a geração dos pais. O menino viu o traficante matar a queima-roupa sua pobre mãe. Relatou tudo na TV com uma lucidez que assusta. Será que estamos com dificuldade de distinguir a vida real da ficção? O crime organizado envolve os poderes de maior prestígio. Como desconfiar do juiz? Nem o prefeito, nem o padre, nem o delegado escapam mais. Todos temos que provar a todo momento nossa inocência. A informação manipulada sem escrúpulos transforma até inocentes em monstros horrorosos.
Você deve estar pensando: sei de tudo isso. Vivo este drama em minha casa, no meu trabalho, quando pego o ônibus, quando vou ao supermercado, quando vejo televisão. Mas qual seria a solução? Somos reféns de toda esta situação? Vamos eternamente ficar apontando os erros? Temos razões para esperar contra toda esperança? Os maus gritam mais forte. Temos que ouvir diariamente o relato dos criminosos nos jornais? Temos mesmo que almoçar com medo de estar comendo algum veneno? Temos como participar do debate. E a Igreja Católica… tem alguma resposta para tudo isso? Existe alguma força que possa animar os que querem cuidar das águas, ser amigos dos animais, defender os pobres, lutar pela escola e pelo leite das crianças, rezar, participar de um retiro, construir família, abraçar os amigos, ir à Igreja, tomar café e contar anedotas, dar um pouco do tempo como voluntário, conversar sobre política, torcer pelo seu time e ir dormir indignado com aquela derrota, tomar sorvete, cultivar um hobby, plantar alguns pés de alface naquele canteiro pequeno nos fundos de sua casa.. ter uma casa, celebrar a festa da vida com um sorriso nos lábios??? Ser normal!
Precisamos desenvolver esta espiritualidade do cotidiano. Já não basta a mística do amor. Precisamos da mística do humor. Ando conversando com pessoas que já ultrapassaram os 80 anos de vida e estou chegando à conclusão de que o segredo da longevidade não está nos medicamentos ou na alimentação. São cuidados necessários, sem dúvida. Mas muitos cuidadosos morreram cedo.
Aquele padre de 90 anos, que ainda celebra missa mesmo estando totalmente cego, sabe rir de si mesmo e até de seus limites. Desafia a morte com bom humor. Encontra sentido para a vida. Precisamos recuperar esta arte de brincar. Brincadeira é coisa muito séria. Acho que era isso que Jesus queria nos dizer quando mandou que todos fossem como as crianças para entrar no reino. Sim… precisamos reaprender a brincar em nossas celebrações, como filhos na presença do Pai. O humor dever reorientar nossa oração, nossos encontros de família, nosso jeito de trabalhar. Brincar é um respiro para a alma.
Quem brinca sabe que o louvor, o elogio, é uma terapia de libertação. Para viver esta mística do lúdico é preciso ser “cheio de graça”, como Maria. Graça no sentido de fazer as coisas com certa gratuidade, sem deixar-se mover unicamente pelo interesse. E graça também no sentido de engraçado. As manchetes dos jornais já são sérias demais. O engraçado é que os pobres, que teriam mil razões para chorar, continuam bem-aventurados com a graça da festa e do sorriso. A santidade está aí… e passa pelo sorrir! Temos uma certeza: Deus está conosco… e brinca também!
Pe Joãozinho scj
quarta-feira, 3 de outubro de 2007
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